segunda-feira, 10 de março de 2025

PEGUE O PRÓXIMO DESVIO; SOJA A CAMINHO DA CHINA. Por Jorge Görgen*

O Porto de Paranaguá movimentou 63,8 mil toneladas de óleo de soja em janeiro, o que representou 72,48% da movimentação brasileira. 

Foto: Claudio Neves/Portos do Paraná

Safra recorde de grãos, principalmente de soja, promete congestionar as estradas em direção aos portos, elevando mais o Custo Brasil. Mesmo assim, surgem oportunidades para transportadores e agricultores.

Os rompantes tarifários de Donald Trump neste começo de mandato prometem escancarar mais oportunidades de comercialização de produtos brasileiros para outros destinos. Uma vez que os portos americanos se fecham para o Made In Brazil. Nesse cenário, a China se fortalece como nosso principal e maior parceiro comercial, principalmente de commodities agrícolas, como a soja. Seja in natura, farelo ou óleo bruto.

Por isso, a combinação de safras recordes de grãos, colheitas feitas em poucas janelas de tempo e a alta nos preços dos combustíveis está provocando uma nova disparada nos valores do frete rodoviário. No Mato Grosso, nas últimas semanas, o incremento de algumas rotas já chega a 40% a mais se comparado com a safra passada.

Embora seja um dos maiores produtores agrícolas do mundo, o Brasil ainda enfrenta sérios problemas logísticos, com poucas ferrovias e hidrovias, estradas de má qualidade, congestionamentos nos portos e reduzida capacidade de estocagem em silos reguladores.

Oportunidades para armazenagem

Nosso limite de armazenamento antes dos portos é estimado em 210 milhões de toneladas. Essa capacidade, frente o volume previsto da safra de grãos, aponta para uma diferença de 115 milhões de toneladas entre o que será colhido e o que poderá ser estocado nas propriedades, cooperativas e empresas do agronegócio.

Segundo a Organização das Nações Unidas para o Abastecimento e Alimentação, os países deveriam ter uma capacidade estática de armazenagem 20% superior ao volume produzido, evitando problemas de excesso e desperdício em caso de superprodução como a que verificamos no Brasil agora.

Com sucessivas safras recordes, o déficit de estocagem vem crescendo no país. Nos últimos 15 anos, a nossa produção de grãos cresceu a uma taxa média de 5,3% ao ano, enquanto a capacidade de armazenagem aumentou só 2,8% ao ano.

Essa discrepância resulta em um patamar significativo, que pode levar a desperdícios na colheita, já que muitas vezes o produtor é obrigado a deixar os grãos “armazenando” a céu aberto. Como vem ocorrendo com muita frequência Brasil afora. Ou os caminhões tornam-se os silos em movimento, no seu lento caminhar em direção aos portos, provocando filas quilométricas às margens das principais rodovias do litoral.

Necessidade de mais investimentos

Pelas estimativas dos fabricantes de equipamentos de silagem, só para acompanhar o crescimento da produção brasileira, que aumenta em média 10 milhões de toneladas por ano, seriam necessários investimentos anuais de 15 bilhões de reais, mas para vencer o déficit atual esse valor pode subir para 120 bilhões de reais.

A solução para este problema eterno da agricultura brasileira, que cria caos logístico em épocas de safras recordes e traz prejuízos aos produtores e ao país, é a expansão de linhas de crédito para construção de silos e armazéns com menos burocracia, além de investimentos na infraestrutura de escoamento da produção agrícola. Estamos falando em ampliar e construir estradas, hidrovias, ferrovias e portos.

Para os produtores, as linhas de crédito deveriam se voltar para a instalação de silos nas propriedades, mirando reduzir a dependência dos agricultores por armazéns da indústria e das cooperativas, que encarecem seus produtos.

Para essa safra, o governo destinou 7,8 bilhões de reais no Programa para a Construção e Ampliação de Armazenagem Agrícola. Esse valor supera em 17% o montante do ano passado.

Desafios logísticos

Em 2024, a participação da armazenagem dentro das fazendas no Brasil foi de 17% com relação a capacidade estática total, enquanto nos EUA é de 65%, na Europa 50% e na Argentina chega a 40%.

Mas como pouco se faz em termos de novos investimentos, tudo indica que teremos mais problemas logísticos nesta safra, a exemplo do que se deu há dois anos, como apontam os dados da Companhia Nacional de Abastecimento. Conforme a empresa estatal o avanço da colheita da soja já tem impactado os preços de transporte de grãos nas principais rotas do país. Seja no sentido Sul e Sudeste, seja no chamado arco Norte.

Por essas razões, em janeiro os fretes dispararam no Mato Grosso, tendência que persistiu também em fevereiro, mês em que já são registrados valores ainda mais elevados de cotações, com possibilidade de recordes de preços em várias rotas.

Se durante a colheita de qualquer safra de soja os preços já sobem, neste momento, a tendência é potencializada por diversos fatores. Primeiramente, trata-se da maior safra da série histórica estadual e Mato Grosso deverá colher mais de 46 milhões de toneladas, cerca de 7 milhões de toneladas a mais em comparação com o ano anterior. 

Nessa safra, devido à grande intensidade de chuvas no verão no Norte do país, 90% do plantio de soja foi realizado em apenas um mês, o que significa que a colheita está sendo feita praticamente de uma vez só. Vale destacar que o produtor tem que encher de soja os caminhões rapidamente para liberar espaço e os corredores para o escoamento da próxima safrinha de milho, que também promete vir forte se o clima continuar ajudando na região.

Custo das filas de caminhões

A fila de caminhões à espera de embarque na franja dos portos aumenta os custos para quem exporta em cerca de 30 mil dólares por dia em média. Esse é o preço cobrado como pênalti quando um navio de contêineres fica no porto por mais tempo do que o estabelecido no contrato com os exportadores. E os armadores que transportam contêineres levam também soja nos porões dos navios.

De acordo com o último levantamento da safra de grãos da Conab, o Brasil deve colher mais de 325 milhões de toneladas, crescimento de 9,4% em relação à temporada anterior. Sendo que houve um aumento de 2,1% na área cultivada, estimada em 81,6 milhões de hectares, como também uma recuperação de 7,1% na produtividade média das lavouras.

Isso tudo para dizer que a nossa ineficiência irá gerar mais filas de caminhões rumo aos portos brasileiros, penalizando o tráfego de automóveis e ônibus nas estradas. Aumentando os riscos e a insegurança nas rodovias e ainda mais os custos logísticos.

Mas graças ao fator Trump, ainda assim compensará para os produtores brasileiros venderem para a China, para a Europa e para outros destinos fora à América, que ficará reservada aos produtores norte-americanos. Aqui vale mais do que nunca o aforismo oriental do Yin e do Yang. Que diz que toda crise gera também nova oportunidade.

Jorge Görgen é jornalista, consultor, especializado nos setores de Transportes e do Agronegócio.

N.R: Jorge Görgen é um experiente profissional de comunicação corporativa com destaque nos setores automotivo e do agronegócio. Atuou como responsável pela Comunicação Corporativa do Iveco Group, liderando estratégias para marcas como IVECO, IVECO Bus, FPT Industrial, IDV e Magirus. Anteriormente, acumulou 14 anos de trabalho na CNH Industrial como Gerente de Relações Institucionais e Comunicação Corporativa, atuando com marcas como Case e New Holland em toda a América Latina. Formado em Comunicação Social/Jornalismo pela PUC/RS, com MBA Executivo em Marketing pelo INSPER e especialização em Comunicação Empresarial, Jorge foi duas vezes premiado como Profissional do Ano de Comunicação Empresarial pela Aberje (2018 e 2023). Também ocupou cargos de liderança, como Vice-presidente da ANFAVEA e de conselheiro da Aberje. Jorge é reconhecido por sua expertise em comunicação estratégica e relações institucionais nos setores em que atua. Para contatos: jlagorgen@gmail.com.

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